quarta-feira, 29 de abril de 2009

Salada com Café: Episódio 6 - Eita língua obscena!

Boa madrugada aos poucos apreciadores das folhas, páginas e vegetais! Atualizando mais uma vez!

Semana passada (24 de abril) me deparei com mais um texto incrivelmente interessante do grande Adauto Suannes, agora sobre o significado das palavras da língua portuguesa. Poderia alongar esta pequena introdução, mas acabei de voltar do futebol semanal contra os futuros juristas da PUC, e não me restam mais forças...

Assim, ai vai o texto, bem como ao fim o v'ideo da bela música citada ao fim.

Aproveitem e comentem!

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OBSCENIDADES NOSSAS DE CADA DIA

Mostrei certa ocasião a meus alunos como as palavras e as expressões têm um destino. Nascem, crescem e, muitas vezes, acabam morrendo. Outras vezes se prostituem, ou, quem sabe?, se regeneram. O exemplo clássico é a palavra formidável, que qualquer garota ficaria feliz de ouvir, referindo-se a ela. Será? Vamos ao dicionário: "formidável - que inspira grande temor, que é perigoso/a, que tem aspecto terrificante". E você sempre dizendo que tem uma sogra formidável, é ou não é? Pois se o Jarbas não tivesse enterrado o latim, dizendo que a sepultura era o destino de uma língua morta, você saberia que formido, em latim, era o nome que se dava ao nosso conhecido espantalho, destinado justamente a causar medo aos pássaros. Formidável, né não?

A propósito, pergunte aos manos ai da sua rua que vem a ser galera. Onze entre dez deles dirá que é um conjunto de torcedores de uma partida de futebol ou de um show de forró ou de rock. Se você disser a eles que, na verdade, galera é "um antigo navio a vela, de mastreação constituída de gurupés e três mastros de brigue", como diz tio Aurélio, eles te cobrirão de porradas. Palavra, por sinal, que provém de porrete (é uma síncope de porretada) e não deriva de porra, como muita senhora imagina, ao censurar seu uso pelo neto, aquele boca-suja, supondo que estejamos falando do líquido fecundante produzido pelos órgãos sexuais dos animais machos, o esperma, a que, em linguagem chula, porra se refere, tanto quanto esporro e langonha, ainda segundo o mesmo pai-dos-burros, muito embora eu jamais tenha ouvido esta última e medonha palavra, que mais parece nome de ex-diretor do Banco Central. Aliás, muito embora registre que porra! seja uma interjeição, mestre Aurélio dá a ela o sentido de enfado, impaciência, o que é menas verdade, como se diz por aí. Se alguém se admira com algo, lá vem o pô!, que, segundo o mesmo professor, é forma sincopada do termo que ele xinga de chulo. Se eu digo "pô, que mulherão que virou aquela mina!" eu não estarei mostrando impaciência, nem enfado, mas algo muito diverso, como sabeis.

Pois voltemos à minha sala de aula. Para confirmar o preconceito que encobre as chamadas chulices (na verdade, quando falamos em "baixo calão" estamos admitindo a existência de um "alto calão", que são os palavrões utilizados pelas classes "superiores"), contei aos alunos a história da Tereza, uma prostituta que engravidou e deu à luz o José. Ela era conhecida na região como Terê, uma abreviatura de seu nome, da mesma forma como o filho passará a ser o Zé. E escrevi na lousa: "José é filho da prostituta Tereza". A classe, a meu pedido, leu a frase, sem atentar para o destino que os aguardava. Depois de algumas considerações, suprimi o nome da mãe, risquei o José e escrevi no alto "Zé", seu apelido. E fui suprimindo da profissão da mãe dele todas as letras desnecessárias, pois, da mesma forma como de Tereza ela se tornara Terê, eliminando várias letras do nome de sua profissão, teríamos uma abreviatura do nome da tal profissão, composto apenas da primeira e das três últimas letras da palavra prostituta. E pedi à classe que lesse o resultado. "José é filho da ..." O número de alunos que conseguiram falar foi mínimo, embora eu estivesse querendo dizer a mesma coisa que eles haviam dito antes.

Isso para não falar da aluna que eu havia reprovado e que se expressou sem meias palavras: "mestre, você me fudeu!" Verbo esse, aliás, empregado por um advogado para ameaçar um oficial de justiça: "você comigo está fodido!" Pois tal ameaça redundou em denúncia e condenação. O recurso caiu nas mãos de ninguém menos do que o Alberto Silva Franco, que deu por não caracterizada ameaça alguma, pois a palavra empregada era inespecífica. Ou, mais exatamente, plurívoca. E pode até mesmo ser elogiosa, conforme as circunstâncias, como quando designa valentia: "fulano é um sujeito fodido!" No dia do tal julgamento, a galeria (conjunto de espectadores, que os americanófilos e os comedores de mac-lanche denominam "audiência", que, como sabemos, é sessão de julgamento judicial) estava repleta, para ter o prazer de ouvir o Silva Franco falar, vezes e vezes, a tal obscenidade. E ele, que é, de fato, um cara fodido, assim o fez. Quem diria!

Falo também (o trocadilho foi involuntário) da distinta senhora que, numa festa, se gabava de haver esculhambado seu desafeto em uma discussão. Apenas por curiosidade, perguntei-lhe o que ela havia feito com os colhões do homem, o que gerou um esporro daqueles, para continuarmos na chulice. E eu fui obrigado a recuar, sem que os presentes percebessem que eu estava indo com o cu para trás, mesmo porque poucos se dão conta da origem da tal palavra. E se numa reunião os componentes de um grupo também forem recuando e alguém ficar sozinho, ele certamente comentará que "ficou na mão", sem atentar que se está referindo à situação de alguém que, tendo sido abandonado pelo companheiro ou a companheira, não terá outra forma de aplacar a inaplacável libido senão pela masturbação.

E olhe que eu poderia falar sobre as flores, essas maravilhas que Deus espalhou na Terra para encanto de nós todos, que não atentamos para o fato de serem elas, ao fim e ao cabo, o órgão sexual da planta. Olhe para um hibisco, por exemplo, e veja se há algo mais obsceno na Natureza. Ou uma orquídea. Cujo nome, aliás, lembra uma espécie que continha um talo e duas bolotas embaixo, donde o nome escolhido pelo seu nominador: orchis (em grego, "pênis") e idéa (em grego, "aparência").

Pensando bem, como as crianças estão entrando na sala, acho melhor fechar o meu dicionário, esse repositório de obscenidades, escrito pelo Aurélio, aquele fescenino, cujo primo nos mandou jogar bosta na pobre da Geni.

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A coluna Circus, integrante do site Migalhas (www.migalhas.com.br), é assinada pelo ilustre migalheiro Adauto Suannes, autor do livro "Justiça & Caos".


terça-feira, 21 de abril de 2009

Salada com Café: Episódio 5 - Mandando bala em Sundance

Caros saladeiros de plantão, o blog ainda vive! Guardem as lágrimas para depois!

Há alguns dias atrás tive o prazer de ver o documentário intitulado "Send a Bullet", do jovem diretor Jason Kohn, que foi premiado no festival de Sundance em 2007.

Trata-se de um trabalho que faz uma estranha conexão entre 3 coisas aparentemente divergentes entre si: a corrupção no Brasil, cirurgia plástica, e os sequestros em São Paulo.

Com uma linda fotografia, esse documentário, apesar de "forçar a barra" em muitos momentos (p.ex.: quando um policial afirma teoricamente ser possível comprar armas nucleares no Brasil), merece ser assitido por todo brasileiro.

Apesar de muitas opiniões contrárias à minha, que vão a favor do filme, faço aqui minha recomendação pela sua visualização. Entretanto, preciso deixar constado que o diretor não fez tal obra audiovisual para ser vista em território brasileiro. Pode parecer estranho, mas é verdade.

Assim, deixo um pouco de mistério no ar sobre o assunto, deixando aqui somente o trailer:



Hoje, como defensor dos direitos autorais não poderia postar as partes do filme. Todavia, em razão se sua "não exibição" no Brasil, me permito contar aos saladeiros que aqui permeiam que o documentário encontra-se na íntegra e legendado no youtube, dividido em 9 partes. Enjoy!

quarta-feira, 1 de abril de 2009

Salada com Café: Episódio 4 - Os "Coroné" do Brasil

Estamos aqui postando mais uma vez. O blog ainda que visitado somente por este que vos escreve, e pelo colega Rafael C., ainda dá sinais de vida.

Na semana passada, apesar de a repercussão não ser tão grande, dois peixes muito grandes foram alvos da Polícia Federal: os Tranchesi, e os Camargo Correa. Está até parecendo nome de máfia italiana dos anos 30. Mas que fique bem claro, não estou dizendo que essas duas são um grupo criminoso. Reservo-me no direito de só obter uma conclusãoobjetiva quando a ultima instância do Judiciário nacional proferir a sua decisão. E o famoso princípio legal, que surgiu após a inquisição, indubto pro reu, ou seja, "na dúvida, a favor do réu".

Mas o Brasil sempre foi assim não é? Há duas semanas acabei de ler o Livro "Código da Vida", de Saulo Ramos. Não posso dizer que tudo que lá foi dito opera-se como verdade, mas que sua visão, como alguém que trabalhou nas entranhas da [nojenta] máquina política, merece ser considerada.

São pessoas, que gastam tanto tempo e energia matutando como passar a perna nos outros, que me faz refletir: por qual motivo não invertem essa ordem de raciocínio? Passam a raciocinar como melhorar o Brasil?

Essa é uma pergunta que ainda não posso responder. Me falta ainda muito conhecimento.

Mas por ora ficamos com o pensamento do jornalista e professor da USP Gaudencio Torquato, colunista da secão "Porandubas Políticas", publicado hoje.

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Coronelismo

O coronel Lucas Pinto, que comandava a UDN no Vale do Apodi (RN), não dormia em serviço. Quando o Tribunal Eleitoral exigiu que os títulos eleitorais fossem documentados com a foto do eleitor, mandou um fotógrafo "tirar a chapa" do seu rebanho, aliás, do seu eleitorado. Numa fazenda, um eleitor tirava o leite da vaca quando foi orientado a posar para a foto. Não teve dúvida : escolheu a vaca como companheira do flagrante. Mas o fotógrafo, por descuido, deixou-o fora. O coronel Lucas Pinto não teve dúvida. Ao entregar as fotos aos eleitores, deparando-se com a vaca, não perdeu tempo e ordenou ao eleitor : "prega a foto aí, vote assim mesmo, na próxima eleição, nós arrumamos a situação".

...Noutra feita, o coronel levou as urnas de Apodi para o Juiz, em Mossoró, quase 15 dias após as eleições. Tomou uma bronca.

- Coronel, isso não se faz. As eleições ocorreram há 15 dias.

- Pode deixar, "seu" Juiz. Na próxima, vou trazer bem cedo.

Não deu outra. Na eleição seguinte, três dias antes do pleito, o velho Lucas Pinto chegava com um comboio de burros carregando as urnas. Chegando ao cartório, surpreendeu o juiz :

- Taqui, seu juiz, as urnas de Apodi.

- Mas coronel, as eleições serão daqui a três dias.

- Ah, seu juiz, não quero levar mais bronca. Tá tudo direitinho. Todos os eleitores votaram. Trouxe antes para não ter problema.

Idos das décadas de 50/60. Não havia grandes empreiteiras financiando campanhas. A empreitada ficava mesmo a cargo dos coronéis.

* Gaudêncio Torquato é jornalista, consultor de marketing institucional e político, consultor de comunicação organizacional, doutor, livre-docente e professor titular da Universidade de São Paulo e diretor-presidente da GT Marketing e Comunicação.